Ações coletivas e comportamento político: produção científica da psicologia social brasileira (1986-2011)

Collective actions and political behavior: scientific production of Brazilian Social Psychology (1986-2011)

  • Frederico Alves Costa
  • Marco Aurélio Máximo Prado
Neste trabalho discutimos produções científicas no campo da psicologia social brasileira sobre ações coletivas e comportamento político. O objetivo é analisar o modo como os autores compreendem a politização das relações sociais e a construção de uma sociedade democrática no interior do debate sobre a circunscrição do conceito do político na atualidade. Os autores foram selecionados a partir de 3 fontes - Grupos de Pesquisa do CNPq, Grupos de Trabalho da ANPEPP, Revista Psicologia & Sociedade - e suas produções analisadas à luz da teoria democrática radical e plural (Laclau & Mouffe). Focalizamos a distância entre os modos de compreensão dos autores e uma concepção do político baseada na articulação entre três momentos - momento da articulação, momento da contingência, momento do antagonismo - e as implicações desta distância. Ademais, sugerimos a inserção da psicologia social no debate sobre o político a partir da retomada da noção de hegemonia em uma perspectiva não essencialista.
    Palavras chave:
  • Psicologia Social
  • Produção Científica
  • Político
  • Democracia
The article aims to analyze the scientific production about collective actions and political behavior written by authors of Brazilian social psychology. The main issue is to analyze how the authors understand the politicization of social relations and the process of building a democratic society. The authors were selected from three sources – Research Groups of the CNPq, Work Groups of the ANPEPP, and Psychology and Society Brazilian Journal – and the papers were analyzed by the perspective of the Plural and Radical Democratic Theory (Ernesto Laclau and Chantal Mouffe). The discussion demonstrates the distance of the articles in relation to the conception of the political based on the articulation between three moments – moment of the articulation, the moment of the contingency, moment of the antagonism – and the implications these distance. Moreover, the discussion suggests the emergence of social psychology in the debate about the political through a resumption of the concept of the hegemony in a non-essentialist perspective.
    Keywords:
  • Psychology
  • Scientific Production
  • Political
  • Democracy

1 Introdução

O estudo das ações coletivas e do comportamento político tem sido um campo de debate na psicologia social e na psicologia política desde as análises sobre massas e multidões construídas no final do século XIX (Prado, 2001). Na psicologia social brasileira, a crise da psicologia social, nas décadas de 1970 e 1980, contribuiu para o enfoque nesta temática de investigação em razão da preocupação com a análise de processos de desigualdade presentes no país, no intuito de se construir uma sociedade mais democrática (Camino, 1996; Lane & Codo, 1987; Sandoval, 2002).

Neste texto temos como objetivo discutir um recorte de artigos analisados em uma pesquisa anterior (Costa, 2014) que teve como objetivo analisar a dimensão do político em parte da produção da psicologia social brasileira sobre temas políticos, publicada em periódicos científicos, entre os anos de 1986 e 2011. O recorte a ser debatido refere-se a artigos empíricos incluídos em uma das categorias temáticas construídas na pesquisa, a categoria temática Ações coletivas e comportamento político. Os artigos que compõem esta categoria temática analisam, a partir de perspectivas teóricas distintas, aspectos psicopolíticos que caracterizam historicamente o campo da psicologia social crítica produzida no Brasil como participação política, estratégia política, posicionamento político de indivíduos e/ou grupos sobre temas políticos.

A relevância de refletirmos sobre a dimensão do político nas produções científicas sobre ações coletivas e comportamento político remete-se a estas produções orientarem-se para a análise de como determinados grupos constroem lutas políticas e/ou têm se localizado nos processos de democratização da sociedade, acarretando a discussão sobre a constituição dos sujeitos políticos e sobre a construção da democracia. Cabe-nos enfatizar que o objetivo neste texto não é propriamente a análise das concepções dos autores sobre ação coletiva e comportamento político, e sim discutir nos artigos localizados na categoria temática Ações coletivas e comportamento político aquilo que foi o problema da pesquisa: como os autores, nos artigos, compreendem a constituição do sujeito político (politização das relações sociais) e a construção de uma sociedade democrática (utopia de sociedade)? Nosso intuito foi debater as implicações da primeira compreensão na segunda.

A pesquisa realizada justificou-se por duas razões principais:

  1. pela preocupação em circunscrevermos a análise do político na atualidade, a fim de contribuirmos para a reflexão sobre o político na psicologia social brasileira. Para isso nos posicionamos no interior do campo de estudo sobre o político, partindo de uma concepção específica para debater a produção científica, a saber, o conceito de político proposto pela Teoria Democrática Radical e Plural, desenvolvida por Ernesto Laclau e Chantal Mouffe (1985/2015) desde meados da década de 1980. Assim procedemos em razão de considerarmos que analisar o político
  2. requer deixar visível como o entendemos, explicitar seu elemento definidor, suas condições de possibilidade e implicações no interior do debate sobre a especificação do político na modernidade. Debate este caracterizado por maneiras distintas, até mesmo antagônicas, de conceber o político, o que tem consequências no modo como se compreende a constituição dos sujeitos políticos e a construção da democracia. A perspectiva da qual partimos localiza-se em um campo antagônico a outras que enfocam a racionalidade dos agentes e/ou o alcance do consenso na análise da dinâmica política (Mouffe, 2009), isto é, na análise das sedimentações, deslocamentos e subversões das relações sociais. Ao contrário, converge com perspectivas não essencialistas que enfatizam a inerradicabilidade do conflito (Laclau, 2005a). Assim como na pesquisa, o debate realizado neste texto foi orientado a partir da concepção do político proposta pela teoria democrática radical e plural.
  3. pelo questionamento de conceitos caros à análise da dinâmica política pela psicologia social crítica brasileira construída após a emergência da crise da psicologia social, como os conceitos de consciência e identidade, em razão de entendermos, por um lado, que foram importantes para a construção de um debate crítico na psicologia social brasileira, mas, por outro lado, que acarretam em limitações para a compreensão da constituição dos sujeitos políticos e da construção da democracia. Este questionamento decorreu de pesquisas que temos realizado há alguns anos nos campos da psicologia social crítica e da psicologia política sobre processos de desigualdade social e sobre a construção de lutas políticas, bem como de nossa participação em encontros acadêmicos como os realizados pela Associação Brasileira de Psicologia Social e pela Associação Brasileira de Psicologia Política.

Devemos ressaltar que não tivemos a pretensão de rejeitar ou desconsiderar perspectivas teóricas distintas daquela a partir da qual nos orientamos para conceber e analisar o político. Nosso intuito é contribuir com o campo da psicologia social crítica brasileira após mais de 30 anos da emergência da crise da psicologia social.

Esta proposta coaduna-se com a compreensão desta “crise” não como limitada a um momento histórico único e ao estabelecimento de uma única perspectiva teórica, mas como a constituição de um imaginário social crítico, caracterizado pela ênfase na dimensão política da produção do conhecimento. Trata-se, assim, de entender a “crítica”, a qual a “crise” se vincula, como uma necessidade constante de problematização do que foi e do que tem sido produzido na psicologia social (Iñiguez-Rueda, 2003; Montero, 2010).

2 Metodologia

Os artigos debatidos neste texto, como apontado acima, são um recorte daqueles analisados em uma pesquisa anterior. A seleção dos artigos para esta pesquisa foi feita a partir dos seguintes critérios:

  1. Critério fontes: mapeamos pesquisadores nos Grupos de Pesquisa do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico / Brasil), Grupos de Trabalho da ANPEPP (Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Psicologia / Brasil) e na Revista Psicologia & Sociedade a partir da presença de termos-chave referentes à dinâmica política1 no nome do Grupo ou no título dos artigos (no caso da Revista).
    A escolha destas fontes decorreu da busca por pesquisadores que têm contribuído com o debate sobre temas políticos e que se encontram vinculados a grupos de pesquisa junto a agências de fomento (CNPq) e à Pós-Graduação (ANPEPP) no Brasil. O foco na Revista Psicologia & Sociedade foi devido este periódico científico ser o principal veículo de divulgação científica da Associação Brasileira de Psicologia Social (ABRAPSO) e ser publicado desde 1986. A ABRAPSO apresenta uma importante especificidade na história da psicologia social crítica no Brasil: ter sido fundada, em 1980, como resposta à crise da psicologia social, articulando desde esta época diversos pesquisadores que têm focalizado a mudança social como uma preocupação central à produção científica, o que tem como implicação a discussão sobre a constituição de sujeitos políticos e sobre a construção da democracia.
  2. Critério pesquisador: acessamos o currículo Lattes de cada pesquisador e selecionamos apenas aqueles que informavam possuir título de mestre e/ou de doutor e vinculação com a psicologia social no campo Área de Atuação do currículo;
  3. Critério artigos: buscamos no currículo Lattes de cada pesquisador selecionado artigos que apresentassem termos-chave referentes à dinâmica política no título;
  4. Critério periódico científico: mantivemos apenas artigos presentes em periódicos que apresentassem pelo menos dois artigos selecionados;
  5. Critério quantidade de artigos por pesquisador: para os pesquisadores que possuíam mais de um artigo, consideramos (a partir do número de citação de cada artigo nas referências bibliográficas de todos os artigos selecionados no critério “d” e do uso do software Publish or Perish) um ou dois artigos por cada período temporal delimitado na pesquisa:1986-1995, 1996-2005, 2006-2011. A única exceção foi considerarmos mais de dois artigos para autores cujo a saída de artigos acarretasse na exclusão de outro pesquisador escolhido na pesquisa.

Os termos-chave utilizados tanto no critério “a” quanto no critério “c” foram organizados a partir de um levantamento dos títulos e palavras-chave nos artigos publicados em todos os números da Revista Psicologia & Sociedade entre 1986 e 2011. Selecionamos aqueles termos que se remetiam diretamente à dinâmica política (sedimentação, deslocamentos e subversões de relações sociais). Posteriormente, os hierarquizamos da seguinte maneira:

  1. Categoria 1: termos considerados centrais à pesquisa: político, política.
  2. Categoria 2: termos derivados dos termos-chave da categoria 1. Exemplo: participação política, comportamento político, consciência política.
  3. Categoria 3: termos que se remetem diretamente à dinâmica política e que não foram considerados nas categorias 1 e 2. Consideramos também termos derivados ou semelhantes aos selecionados para a categoria 3. Exemplo: poder (empoderamento), movimentos sociais (ação coletiva), comunidade (comunitário).

Em relação aos grupos do CNPq, acessamos o Diretório dos Grupos de Pesquisa do CNPq (censos e base corrente) e selecionamos aqueles grupos que apresentavam no nome do grupo, no título da linha de pesquisa e/ou nas palavras-chave da linha de pesquisa um dos termos-chave da categoria 1 e que possuíssem no título um dos termos-chave das categorias 1, 2 ou 3 ou que apresentassem neste a expressão “psicologia social”.

Para os grupos da ANPEPP, acessamos o site da ANPEPP e buscamos os grupos presentes em cada um dos Simpósios realizados. Selecionamos aqueles grupos que apresentavam no nome do grupo ao menos um dos termos-chave das categorias 1, 2 ou 3.

Quanto à seleção dos artigos, selecionamos aqueles que apresentavam no título ao menos um dos termos-chave das categorias 1 ou 2 e ao menos um dos termos-chave das categorias 1, 2 ou 3 nas palavras-chave. Uma exceção refere-se a artigos publicados entre os anos 1986 e 1995: diante da escassez de artigos selecionados neste período a partir do critério anterior, decidimos por considerar também artigos com termos-chave da categoria 3 no título e não considerar o critério palavras-chaves nos resumos para aqueles publicados na revista Psicologia & Sociedade, pois as publicações desta revista neste período não apresentavam resumo.

Ao final da aplicação destes critérios foram selecionados 78 pesquisadores e 90 artigos, publicados em 24 periódicos científicos, não existindo um critério de proporcionalidade de número de artigos por período temporal (32 artigos entre 1986-1995; 22 entre 1996-2005; 36 entre 2006-2011). Em razão do não acesso a seis destes artigos e também de 12 deles não permitirem uma análise específica e mais aprofundada sobre a dinâmica política, analisamos na pesquisa 72 artigos.

A discussão aqui proposta focaliza 17 destes 72 artigos, os quais foram incluídos na categoria temática Ações coletivas e comportamento político, que comporta pesquisas empíricas sobre estes fenômenos. Assim, ainda que utilizemos artigos que abordam conceitualmente a discussão sobre ações coletivas e comportamento político, nosso objeto nesse texto são estes 17 relativos a pesquisas empíricas. Estes artigos foram publicados em oito periódicos científicos, principalmente, entre 2006-2011 (12 artigos), existindo outros três no período entre 1996 e 2005 e outros dois no período entre 1986-1995.

Cada um dos artigos selecionados na pesquisa foi lido em sua totalidade e, a partir do foco no modo como os autores/as abordavam a constituição do sujeito político (politização das relações sociais) e em noções centrais à teoria democrática radical e plural (sobretudo, a noção de antagonismo), foram construídas quatro vertentes analíticas: fundamento último da realidade; sujeito racional; sujeito ético-político; antagonismo. Centramo-nos em aspectos que se encontravam explícitos nos artigos e que nos permitiam desenvolver o debate sobre a dimensão do político.

Nosso objetivo não foi rejeitar ou desconsiderar concepções sobre o político presentes nos artigos, e sim, a partir de uma concepção de político específica, construir análises que contribuam para a compreensão de perspectivas distintas na produção da psicologia social sobre a constituição do sujeito político e suas implicações para a construção da democracia. Na Tabela 1 trazemos uma breve identificação dos artigos analisados.

Todos os artigos distanciam-se da concepção de um sujeito abstrato e a-histórico e também afirmam um posicionamento político em direção à mudança social. Nestes aspectos, ainda que de modos distintos, encontram-se vinculados à crítica realizada pela psicologia social brasileira na emergência de sua crise nas décadas de 1970-1980.

Artigo Tema Vertente analítica Periódico
Adrião e Toneli (2008) Sujeito do feminismo e as políticas da identidade no movimento feminista Antagonismo Psicologia & Sociedade
Azeredo (1988) Sexismo e racismo na relação entre patroas e empregadas Sujeito racional Psicologia & Sociedade
Barboza (2000) Exclusão/inclusão de catadores de material reciclável Sujeito ético-político Psicologia & Sociedade
Cardia (1989) Lideranças intermediárias em movimentos sociais Sujeito racional Psicologia & Sociedade
Castro-Silva, Hewitt e Cavichioli (2007) Participação política em ONG/Aids Sujeito racional Psicologia & Sociedade
Costa, Machado e Prado (2008) Participação política no movimento social LGBT Antagonismo Interamerican Journal of Psychology.
Fernandes, Costa, Camino e Mendoza (2006) Valores e participação política de estudantes Sujeito racional Psicologia Política
Gomes e Maheirie (2011) Participação política no Movimento Passe Livre Antagonismo Psicologia Política
Gonçalves (2009) Participação política de mulheres Sujeito racional Pesquisas e práticas psicossociais
Leite e Aragão (2010) Construção do sujeito ético-político em um fórum popular Sujeito ético-político Fractal: Revista de Psicologia
Mayorga, Magalhães, Patrício, Cruz e Alves (2008) Participação política no Coletivo Hip Hop Chama Antagonismo Pesquisas e práticas psicossociais
Mendoza e Camino (2000) Participação política de estudantes e configuração do espaço político Fundamento último da realidade Psicología Política (Espanha)
Menezes e Castro (2006) Formas de subjetivação e dificuldades na convivência entre jovens Antagonismo Psicologia Política
Nunes e Camino (2011) Atitude político-ideológica e inserção social de estudantes Sujeito racional Psicologia & Sociedade
Pereira e Camino (2003) Representações sociais e posicionamento político de estudantes Sujeito racional Psicologia: Reflexão e Crítica
Rodrigues e Prado (2010) Constituição do Movimento de Mulheres Negras Antagonismo Psicologia & Sociedade
Silva (2007) Processo de conscientização política em trabalhadores e trabalhadoras rurais Sujeito racional Estudos e Pesquisas em Psicologia

Tabela 1

Artigos analisados por temática abordada, vertente analítica e periódico científico

3 A politização das relações sociais e a construção da democracia: teoria democrática radical e plural

Uma estratégia para se configurar como política, segundo Ernesto Laclau (2005b), necessita envolver uma síntese “indissociável” de três momentos:

Um momento da articulação – a instituição do social; um momento da contingência, na medida em que aquela instituição é uma alternativa entre aquelas que são possíveis em um dado contexto; um momento do antagonismo – a instituição será somente possível através de uma vitória hegemônica sobre vontades conflitantes. (p. 69, tradução nossa)

O momento da contingência é possível na medida em que se concebe que não há um fundamento último da realidade, sendo qualquer objetividade social instituída a partir do “momento da articulação”. Isto é, da articulação entre demandas políticas em torno de um imaginário social que, ao mesmo tempo, que visa preencher a plenitude vazia do social (inexistência de um fundamento último), implica, necessariamente, a exclusão de alternativas antagônicas, delimitando fronteiras políticas e, portanto, relações de poder que tornam impossível o ideal de uma sociedade reconciliada. A dinâmica política caracteriza-se, assim, pela luta entre projetos hegemônicos de sociedade, que visam transformar uma concepção particular em universal, invisibilizando sua contingencialidade. Hegemonia é um tipo de relação política caracterizada por essa convergência entre objetividade e poder.

Sujeito e sociedade são concebidos pela teoria democrática radical e plural em uma perspectiva ontológica não essencialista, definidos como vazios, pois não determinados por qualquer fundamento último da realidade, e também como precários, no sentido da impossibilidade de qualquer totalidade plena. A constituição do sujeito é compreendida a partir da identificação com discursos que delimitam a organização e as práticas de uma comunidade política num determinado contexto histórico, e a constituição da sociedade, a partir de sedimentações, deslocamentos e subversões das relações sociais pelos sujeitos. Trata-se, desse modo, de uma perspectiva psicossocial pós-fundacionalista que visa debater possibilidades de enfrentamento a relações de dominação.

A teoria compreende a constituição dos sujeitos políticos a partir da noção de antagonismo, entendendo-os como construídos não como “positividades” e sim como “negatividades”. Isto é, não são identidades constituídas através do compartilhamento de atributos pelos indivíduos e que se politizam, posteriormente, a partir da mediação da racionalidade, numa relação de oposição (teorias da identidade social e da identidade coletiva). São sujeitos que se constituem no próprio momento do conflito, a partir de um processo de subversão por um “nós” de práticas discursivas hegemônicas reproduzidas por um “eles” e, ao mesmo tempo, da afirmação pelo “nós” de uma alternativa de sociedade, delimitando uma fronteira política na disputa pela instituição da sociedade. A subversão significa a re-literalização do discurso hegemônico em sua particularidade, a partir da identificação do “nós” a um discurso que articula os princípios democráticos da liberdade e da igualdade de maneira irreconciliável ao discurso hegemônico e que busca ocupar (tarefa sempre impossível) a plenitude vazia do social. A identificação com um discurso que subverte ontologicamente o campo de representação hegemônico é a única possibilidade de existência do sujeito político.

Portanto, consensos na democracia moderna são concebidos como fixações parciais hegemônicas na disputa por modos de significação da realidade, pelo próprio fundamento sob o qual se constitui a ordem social. Assim, considera-se que os limites para se alcançar um consenso sem exclusão, defendido por teóricos deliberativos como Jurgüen Habermas, não são limites empíricos ou epistemológicos, capazes de serem solucionados pela racionalidade. Trata-se de limites ontológicos que decorrem da divisão relativa à disputa entre imaginários sociais antagônicos, que articulam diferentes formas de vida que não podem ser isoladas do debate público porque são intrínsecas a qualquer comunicação ou deliberação (Mouffe, 2009).

A dimensão do político, portanto, está para além do racionalismo liberal, no sentido em que indica “os limites de qualquer consenso racional e mostra que qualquer consenso se baseia em actos de exclusão” (Mouffe, 1993/1996, p. 165). Assim, a crença liberal de que o interesse geral decorre da livre discussão de interesses privados, sendo possível alcançar, desta forma, um consenso racional universal, torna o liberalismo cego ao fenômeno político.

4 Vertentes analíticas das ações coletivas e do comportamento político

4.1 Fundamento último da realidade

De maneira geral, nesta vertente analítica, os autores dos artigos selecionados na pesquisa compreendem as relações de produção como um fundamento último da realidade na análise da dinâmica política. Assim, ainda que afirmem a construção histórico-social dos sujeitos e defendam uma expansão do proletariado como sujeito histórico em direção às forças populares, apontam para uma determinação, em última instância, da economia, sendo a constituição dos sujeitos políticos entendida em torno de duas estruturas hegemônicas afirmadas a priori – burguesia e forças populares. A luta política é concebida em torno da noção de contradição, de maneira que a negação é entendida como um momento interno e necessário ao próprio sistema, diferente da noção de antagonismo, na qual a subversão é compreendida nos termos da radicalidade da contingência.

Entre os 17 artigos analisados na categoria Ações coletivas e comportamento político, apenas um artigo localiza-se nesta vertente analítica: Roberto Mendoza e Leoncio Camino (2000). Estes autores discutem a participação política de estudantes e a configuração do espaço político a partir da perspectiva teórica materialista-histórica-dialética, a qual teve e ainda tem papel importante na produção científica da psicologia social crítica no Brasil que emergiu a partir da crise da psicologia social.

O artigo de Mendoza e Camino (2000) localiza-se nesta vertente analítica na medida em que nele a esfera econômica é considerada como aquela que “sustenta todo o edifício social, [e] determina em última instância as formas de organização da sociedade política, das pautas ideológicas-culturais e conforma as próprias identidades dos grupos e das classes sociais (Bottomore, 1992; Bobbio, 1986)” (p. 10, tradução nossa).

Para os autores, a sociedade é compreendida como uma “totalidade social contraditória” e a política é definida como “o processo através do qual as classes que têm interesses contrapostos lutam por obter, reter ou influir no poder do Estado” (Mendoza & Camino, p. 10, tradução nossa, grifo nosso).

Entendemos que a determinação da economia e a concepção dos sujeitos políticos como classes sociais dificulta compreendermos a pluralidade de sujeitos políticos e de demandas politicas presentes nas sociedades ocidentais modernas. Estas concepções acarretam na redução do sujeito político a uma necessidade histórica, pois a sua constituição e a dinâmica política são determinadas em última instância pela economia. Tornam possível, assim, reproduzir dicotomias como entre lutas principal e secundária, entre “velhos” e “novos” movimentos sociais, criticadas por diferentes autores (Alvarez, Dagnino & Escobar, 2000; Butler, 2000; Fraser, 1997) em razão de promoverem reducionismos na análise das ações coletivas contemporâneas.

Ao recorremos à compreensão do político que orientou a análise da pesquisa, cabe-nos ressaltar a importância do momento da contingência, proposto por Laclau (2005b), para a compreensão da estratégia política na atualidade, pois é o que nos permite falar em práticas articulatórias, sob as quais se constituem a pluralidade de sujeitos políticos e a luta democrática.

Ao reconhecermos a inexistência de um fundamento último da realidade (como o reducionismo econômico) e a pluralidade de sujeitos políticos como características da democracia moderna, faz-se possível conceber o espaço político como descentrado, permitindo estender a luta democrática para todas aquelas áreas em que exista relação de dominação (Laclau & Mouffe, 1985/2015). A luta política é, assim, uma luta entre projetos hegemônicos de sociedade que se constituem não a partir da contradição entre duas classes sociais fundamentais, mas de identificações discursivas com imaginários sociais antagônicos no interior das possibilidades e condições históricas específicas.

Portanto, ao rompermos com concepções essencialistas de sujeito e de sociedade, tanto a luta de classes quanto lutas referentes a outras relações de dominação são entendidas como construídas a partir da expansão do imaginário igualitário da revolução democrática para diferentes relações sociais, politizando-as como formas de opressão (Laclau & Mouffe, 1985/2015).

Neste quadro teórico não essencialista, não há garantias que determinadas subversões ou deslocamentos na objetividade social produzirão sociedades mais democráticas, assim como nenhum sujeito poderá se afirmar, a priori, promotor da emancipação social. As características ideológicas dos sujeitos políticos e, assim, das ações coletivas não são determinadas do começo, e sim dependentes do momento da articulação (Laclau, 2005b).

4.2 Sujeito racional

De modo geral, nesta vertente analítica os autores compreendem a constituição do sujeito político a partir das noções de identidade e de consciência e não abordam, ao menos explicitamente, a ideia de um fundamento último da realidade, distinguindo-se da vertente analítica anterior. Têm por foco o processo do indivíduo tornar-se consciente das relações de subordinação (perceber as injustiças sociais), opondo seus interesses pessoais e grupais aos interesses de um outro grupo, sendo ressaltada a reflexividade e/ou a intencionalidade dos indivíduos. A luta política pode ser entendida em torno de uma oposição entre identidades constituídas “positivamente” e não a partir do momento do antagonismo.

Oito dos 17 artigos analisados neste texto (aproximadamente, a metade dos artigos) foram localizados nesta vertente analítica: Sandra Azeredo (1988), Nancy Cardia (1989), Cícero Pereira e Leoncio Camino (2003), Sheyla Christiane Santos Fernandes, Joseli Bastos da Costa, Leoncio Camino e Roberto Mendoza (2006), Alessandro Soares da Silva (2007), Carlos Roberto de Castro-Silva, W. E. (Ted) Hewitt e Silvana Cavichioli (2007), Betânia Diniz Gonçalves (2009), Aline Vieira de Lima Nunes e Leoncio Camino (2011).

Silva (2007) e Gonçalves (2009), nas análises que realizam sobre conscientização política e participação política, recorrem, sobretudo, à concepção de Salvador Sandoval sobre consciência política e participação política. Observa-se uma relação triádica entre socialização, participação e consciência no debate dos autores. De acordo com Gonçalves (2009),

Conceitos consciência política e participação política se articulam e efetivamente se interligam. A qualidade e o tipo de consciência política, considerando o processo de socialização política do sujeito, mantêm uma relação de interdependência. Além disso, não se pode desconsiderar o contexto no qual os sujeitos se inserem, ou seja, o contexto histórico-político-cultural-social influencia na construção da sua consciência e na participação política. (p. 200, grifo no original)

De acordo com Silva (2007), “uma questão importante no processo de construção da consciência política é a re-socialização contínua, construída durante as práticas da vida, as quais são dadas cotidianamente e surgem segundo as oportunidades psicopolíticas ao dispor de cada sujeito” (p. 116).

Tanto Silva (2007) quanto Gonçalves (2009) abordam que a concepção de consciência política proposta por Sandoval foi influenciada pela concepção de consciência operária de Alain Touraine, que apresenta como princípios: a concepção do indivíduo sobre a dinâmica social (relações de poder); o reconhecimento do indivíduo sobre sua classe e a diferença desta em relação a classes que ele não pertence; a percepção e atribuição de sentido pelo indivíduo aos conflitos de interesse entre sua classe e a classe dominante. A esta concepção, segundo os autores, Sandoval acrescentou outro aspecto: a predisposição para intervenção. Segundo Gonçalves (2009), Sandoval ressalta, assim, que a consciência está diretamente ligada à busca pelo auto-interesse e pelo interesse de sua classe.

Nesse sentido, cabe-nos considerar que Salvador Sandoval (1989) propõe que a passagem dos interesses individuais para os interesses coletivos “se dá na interseção entre os fatores estruturais, as relações sociais interativas, as visões de mundo com seus pré-conceitos de fundo cultural e as reflexões conscientes de custos e benefícios de participar” (p. 68, grifo nosso).

Assim, podemos considerar que a consciência política, que se refere à constituição do sujeito político, na proposta de Sandoval é mediada pela racionalidade instrumental (custos/benefícios) e pela disputa de interesses entre grupos sociais. Ademais, como apontam Silva (2007) e Gonçalves (2009), a consciência política nesta proposta é concebida em torno de níveis de complexidade da consciência, que vão desde a “consciência do senso comum” até a “consciência revolucionária”, indicando mais uma vez para o papel da racionalidade na compreensão da dinâmica política.

Importante ainda salientar que o modelo de consciência política de Sandoval, segundo Silva (2007), foi também influenciado pela teoria da identidade social de Tajfel no que se refere ao aspecto da identificação do adversário na construção da luta política. Outros artigos dessa vertente analítica baseiam-se na teoria da identidade social, considerando normas, valores e significados na análise das concepções dos indivíduos e dos sujeitos coletivos. Deve-se lembrar que a teoria da identidade social apresenta uma ênfase na racionalidade e na intencionalidade dos indivíduos: as matrizes do experimento de Tajfel utilizadas para estudar “grupo mínimo”, que subsidiaram a construção da teoria, foram inspiradas na teoria dos jogos (Torres & Camino, 2011).

Nancy Cardia (1989) ao apresentar a perspectiva teórica que orienta sua pesquisa sobre lideranças intermediárias em movimentos sociais aborda a teoria da identidade social de Tajfel ao compreender que o estilo de uma liderança democrática “estaria associado a um clima social que permitisse a reconceitualização de uma identidade social negativa e o desenvolvimento de uma filiação psicológica ao grupo (Tajfel, 1981, Melucci, 1977 e Milbrath & Goel, 1977)” (p. 74). Ademais, ao caracterizar o ativista político concebe que,

Teriam: consciência política apresentando sensação de privação relativa e fraterna (Gurr, 1970, Kinder & Sears, 1985) e atribuiriam a responsabilidade por suas condições de vida ao sistema mais amplo (Gurin & Epps, 1975). Estes ativistas apresentariam ainda eficácia política individual (Almond & Verba, 1963) e grupal (Kinder & Sears, 1985). (p. 75)

Cícero Pereira e Leoncio Camino (2003), Sheyla Fernandes et al. (2006), Aline Nunes e Leoncio Camino (2011), os quais realizam pesquisas referentes ao comportamento político de estudantes, também recorrem à teoria da identidade social de Tajfel, articulando-a com a teoria das representações sociais e com a teoria das minorias ativas, de Moscovici.

Pereira e Camino (2003) compreendem que a emergência dos conflitos sociais apresenta como fatores decisivos a percepção de injustiça social e de eficiência política. Tais conflitos são desencadeados diante de um conflito cognitivo gerado pela situação de desacordo de um indivíduo em relação àqueles que compartilham o mesmo grupo de pertença. Para os autores, a teoria da identidade social oferece “as bases para a compreensão da formação simbólica dos grupos sociais” (p. 449).

Fernandes et al. (2006) e Nunes e Camino (2011) compreendem a dinâmica política a partir de posicionamentos ideológicos distintos entre indivíduos que se constituem em torno de pertenças grupais (identidade social), disputando a visão-de-mundo a ser sedimentada na sociedade. Compreensão que se, por um lado, denota similitude com a noção de hegemonia, por outro lado, ao basear-se na noção de identidade social, concebe o sujeito político a partir da politização de “identidades positivas”, afastando-se, assim, do momento do antagonismo (Laclau, 2005b).

Nesses seis artigos abordados, nos quais é comum a influência da teoria da identidade social, a racionalidade e a intencionalidade dos indivíduos são os mediadores do processo de politização das relações sociais. O que aponta mais para a compreensão do campo político como um campo de representação de interesses entre identidades previamente constituídas do que como entendido em termos antagônicos. Isso implica o risco de se reduzir o campo do político à gestão da positividade social, isto é, ao conteúdo ôntico da contagem das partes que constituem a comunidade política, afastando-se da compreensão do político como fundado na disputa pelo princípio ontológico da comunidade política (Laclau, 2005a).

Deste modo, a luta democrática se limitaria ao que é passível de ser negociado no interior do discurso hegemônico, gerando lógicas políticas que ressaltam a particularidade das demandas democráticas e não o seu caráter equivalencial, que permite a articulação de diferentes demandas antagônicas à hegemonia na construção de alternativas contra-hegemônicas. O sujeito político seria concebido naqueles artigos a partir de uma relação de oposição ao discurso dominante e não pela identificação com discursos antagônicos.

Os artigos de Sandra Azeredo (1988) e de Carlos Castro-Silva et al. (2007), o primeiro sobre a inter-relação entre a ideologia sexista e a ideologia racista na relação entre patroas e empregadas e o segundo sobre participação política, também se pautam na compreensão de um sujeito racional, sendo a politização das relações sociais entendida a partir do desenvolvimento de uma consciência política.

Em Castro-Silva et al. (2007) a consciência política pode ser entendida como aquisição de informações sobre direitos - “fortalecimento psicossocial de sujeitos de direitos” (p. 81). O campo político é compreendido como um campo de representação de interesses entre identidades previamente constituídas e não há questionamento dos autores quanto à expectativa dos indivíduos por uma sociedade reconciliada - “uma comunidade mais cidadã, fraterna e saudável” (p. 85). A discussão se aproxima mais da ideia do consenso nos termos da teoria deliberativa do que do consenso como uma fixação parcial hegemônica.

Quanto ao artigo de Azeredo (1988), dois aspectos a salientar são as críticas à homogeneização e à essencialidade da categoria “mulher” e também à leitura economicista presente nos estudos no Brasil, na época, sobre a relação entre patroas e empregadas. Contudo, como nos outros artigos, se, por um lado, a sedimentação do social é concebida em torno de uma naturalização de relações de dominação, sendo possível afirmarmos uma relação entre objetividade e poder; por outro lado, a compreensão da politização das relações sociais a partir do processo de identidades prévias que se politizam (consciência política) acarreta no risco de limitarmos o campo do político à gestão da positividade social.

4.3 Sujeito ético-político

De modo geral, nesta vertente analítica, o sujeito político é concebido como um sujeito ético-político, sem que fique explícito o elemento mediador de sua constituição, e a democracia é entendida como um projeto ético, baseado na oposição entre a alteridade e a hostilidade/violência nos vínculos entre os indivíduos. Estas concepções fundamentam-se na compreensão que o enfrentamento a relações de dominação requer uma junção entre ética e política, o que implica compreender o campo político como um campo da multiplicidade (negação de toda transcendência) ou como produtor de uma sociedade reconciliada, sendo o conflito concebido apenas como temporário e não como a própria condição de constituição dos sujeitos políticos e da democracia.

Dos 17 artigos discutidos neste texto, dois localizam-se nesta vertente analítica: Daiani Barboza (2000), Lidiane Leite e Elizabeth Maria Andrade Aragão (2010).

Leite e Aragão (2010) propõem-se a discutir “a idéia de cidadania atrelada à perspectiva ética de conformação do sujeito político” (p. 545) e afirmam recorrer, principalmente, às noções de poder e de ética em Michael Foucault. Afirmam que a articulação entre política e ética se constitui a partir da construção das análises sobre o poder no campo da governamentalidade e, portanto, do poder como conjunto de relações reversíveis, como estratégias e relações de forças que produzem subjetividades.

Nesse quadro analítico, a constituição do sujeito político significa a constituição do indivíduo como sujeito da ação na “trama geral das governamentalidades”, sendo o cuidado de si a estratégia de governamentalidade que produz sujeitos “de forma autônoma, livre das relações de dominação e sujeição” (Leite & Aragão, 2010, p. 549). A liberdade é considerada a condição ontológica da ética, buscando o sujeito ético-político criar novos modos de existir, de afirmar práticas de liberdade. A ética do cuidado de si é concebida como:

Um exercício, um cuidado consigo mesmo, com o outro e com o mundo que, no terreno da luta política, traduz-se em movimentos de problematização quanto à prática de direitos universalizantes e transcendentais, quanto às diversificadas formas de assujeitamento, dominação e controle produzidas pelas tecnologias de governo, às formas de anulação da política, à limitação aos impulsos participativos e democráticos e, também, quanto à limitação das relações de liberdade. (Leite & Aragão, 2010, p. 550).

Cabe-nos ressaltar no artigo destas autoras que a dinâmica política é caracterizada pela contingencialidade, indicada a partir da compreensão da possibilidade de modos alternativos de existência. Entretanto, a concepção da liberdade como condição ontológica da ética e a concepção da utopia democrática pautada na junção entre ética e política acarretam em conceber que o que se impõe à liberdade é avesso à política. O que significa

Imaginar que existe um ponto onde ética e política pudessem perfeitamente coincidir, e isto é precisamente o que eu estou negando, pelo fato de que isso significa apagar a violência que é inerente à sociabilidade, violência que nenhum contrato ou diálogo pode eliminar, por constituir uma de suas dimensões. (Mouffe, 2009, pp. 134-135, tradução nossa).

Desse modo, poderíamos conceber o campo político em Leite e Aragão (2010) como um campo que se afasta da divisão, apontando para um campo da multiplicidade, no qual se verifica “uma perseguição sem fim do reconhecimento do Outro” (Mouffe, 2009, p. 129, tradução nossa). Assim, trata-se de um pluralismo que rechaça qualquer possibilidade de transcendência, de representação, mesmo a afirmação de uma comunidade política como uma objetivação social hegemônica (momento da articulação) e, portanto, inerentemente precária. Trata-se, assim, de uma proposta que parece se fundamentar numa imanência radical e, dessa forma, num enfoque ontológico que impede pensar o momento do antagonismo.

Esta negação dos momentos da articulação e do antagonismo implica o questionamento sobre qual seria o elemento mediador na produção da “problematização, inquietação, desestabilização e ação” característico do cuidado de si. Diante da junção entre ética e política não é possível pressupor a identificação com um imaginário social antagônico às práticas reprodutoras de relações de dominação como mediação. A política seria possível apenas numa completa oposição ao instituído e no rechaço a uma nova rearticulação do social.

Leite e Aragão (2010) afirmam que o cuidado de si permite a organização e a produção da consciência, o que poderia indicar a vinculação do elemento mediador a um processo de racionalização. Entretanto, diante da aproximação com uma ontologia imanente pode-se melhor apontar para uma essencialidade do sujeito político, como se fosse natural aos oprimidos rebelarem-se contra a dominação. Essa essencialidade também é possível de ser considerada no artigo de Barboza (2000) a partir da noção de “potência de ação”.

Barboza (2000) discute a constituição do sujeito excluído, buscando entender como práticas cooperativas podem contribuir para superação do sofrimento acarretado pelas condições de exclusão. Remetendo-se a Bader Sawaia, entende que na sociedade contemporânea, em decorrência de aspectos como o individualismo, o consumismo, o dogmatismo, é necessário vincular ética e política. Para tanto, visa “a construção de uma práxis em nossa realidade social mais humanizadora, plural e cidadã, com vistas à construção de sujeitos abertos à alteridade e à emancipação” (p. 64, nota de rodapé 2).

A politização das relações sociais é concebida por Barboza (2000) a partir do conceito utilizado por Sawaia, influenciada pelas ideias de Espinoza, de “potência de ação”. Segundo Barboza (2000), o “despertar da potência de ação” nos sujeitos fomenta “a cidadania, a democracia e a esperança, facilitando-lhes a criação de vínculos que possam contribuir com a construção de um processo de qualificação pessoal e social, fortalecendo-lhes a integração comunitária” (p. 61).

Assim, a alternativa para as relações de subordinação é o fomento à “formação de referenciais de solidariedade, de cooperação e do sentido de comunidade” (p. 60), entendendo “comunidade como referencial na luta contra o sofrimento e na busca pela ‘felicidade ética e política’ (Sawaia, 1999)” (Barboza, 2000, p. 60). Essa noção de construção de uma sociedade democrática está atrelada à concepção de cidadania entendida como sentir-se igual aos outros, bem como à compreensão de que, a partir da integração comunitária, as identidades se tornam “crioulas”, perdem o sentido de si e do outro, de modo a disporem-se de si para si e para o outro.

A afirmação de que as identidades se tornam crioulas, por um lado, indica para o caráter relacional das identidades, por outro lado, na forma como se concebe a democratização das relações sociais, ressalta-se a abertura para a alteridade e fica invisibilizado o “momento do antagonismo”, indicando para a possibilidade do alcance de uma junção entre ética e política. A noção de comunidade, nesse sentido, é apresentada na utopia do fim da divisão, como se fosse possível alcançarmos uma sociedade reconciliada completamente oposta àquela caracterizada por relações de dominação. O que aponta para a crítica de Prado (2002) referente à negação do antagonismo como um processo político na concepção comunitarista presente na psicologia comunitária latino-americana: “o antagonismo é somente funcional e termporariamente admitido até que se possa construir um conjunto normativo de definição da identidade coletiva, que muitas vezes se apresenta como uma negação total da sociedade, já que esta é desumana e ideologizada” (p. 208).

A crítica à junção entre ética e política que propomos não significa a negação de uma relação entre ética e política na construção democrática, mas aponta para questionamentos em relação à compreensão do político nessas análises, tanto no que tange ao elemento mediador da politização das relações sociais quanto à proposta de democracia. Na teoria democrática radical e plural, a relação entre ética e política é concebida em torno de um “investimento radical”, isto é, como uma distância entre o que “é” e o que “deve ser” que não pode ser preenchida plenamente, mas apenas a partir de uma nomeação hegemônica, na medida em que o antagonismo é inerradicável. Tal relação, nestes termos, implica a “impossibilidade da sociedade”, ao mesmo tempo em que se faz necessária a nomeação de uma sociedade, sendo esta a única possibilidade dos sujeitos se constituírem como presença discursiva, já que não se trata de “identidades positivas” que se politizam, mas de sujeitos constituídos pela negatividade. Ademais, cabe-nos ressaltar, que diante do momento da articulação ser concebido numa perspectiva não essencialista, não há nada que garanta, a priori, que a luta política se constituirá em torno de um imaginário social progressista, sendo a luta política indeterminada (Laclau, 2005a).

4.4 Antagonismo

Esta vertente analítica engloba artigos que abordam a noção de antagonismo, proposta por Laclau e por Mouffe, na discussão sobre a dinâmica política. Podemos observar nos artigos uma variação nas análises, sendo a noção de antagonismo articulada a conceitos de outras perspectivas teóricas que se afastam da noção do político na teoria democrática radical e plural, aproximando-se de outras vertentes analíticas discutidas (sujeito racional e sujeito ético-politico). Diante destas articulações teóricas, ressaltamos o modo como os autores concebem a constituição dos sujeitos políticos e a construção da democracia.

Entre os 17 artigos debatidos neste texto, seis pertencem a essa vertente analítica: Jaileila de Araújo Menezes e Lúcia Rabelo de Castro (2006), Karla Galvão Adrião e Maria Juracy Filgueiras Toneli (2008), Frederico Alves Costa, Frederico Viana Machado e Marco Aurélio Máximo Prado (2008), Claudia Mayorga, Manuela de Souza Magalhães, Cláudio Junio Patrício, Daniel Antonio Gomes Cruz e Suellen Guimarães Alves (2008), Cristiano dos Santos Rodrigues e Marco Aurélio Máximo Prado (2010), Marcela de Andrade Gomes e Kátia Maheirie (2011).

No caso dos artigos de Costa, Machado e Prado (2008) e de Rodrigues e Prado (2010), relativos à participação política e à constituição e dinâmica de um movimento social, respectivamente, observa-se uma proposta de articulação entre os conceitos de antagonismo e de hegemonia, propostos pela teoria democrática radical e plural, indicando uma compreensão de democracia baseada na impossibilidade de uma sociedade reconciliada, com uma compreensão de identidade política como uma identidade coletiva politizada, sendo os autores influenciados pelo conceito de identidade coletiva proposto por Alberto Melucci. Assim, esses artigos, no que tange à compreensão do sujeito político, aproximam-se da vertente analítica sujeito racional, pois a análise depende do conceito de consciência política na explicação da politização das relações sociais. Rodrigues e Prado (2010) resgatam também na análise da constituição e dinâmica de movimentos sociais a noção de estrutura de oportunidades políticas, proposta por Sidney Tarrow, evidenciando ainda mais a influência racionalista no debate.

Mayorga, et al. (2008) também retomam o conceito de identidade coletiva na compreensão dos movimentos sociais, afirmando que é a partir deste conceito e de uma concepção de identidade influenciada pela noção de antagonismo que analisam o objeto de estudo do artigo, a participação política, levando a mesma proximidade com a noção de um sujeito racional já apontada. Ademais, é interessante considerar que Mayorga et al. (2008) discutem a articulação entre diferentes lutas políticas a partir do conceito de tradução de Boaventura Sousa Santos. Podemos entender que esse conceito, diferente do momento da articulação em Laclau (2005b), apresenta uma vinculação necessária a um processo emancipatório, o que acarreta na limitação da contingência, pois implica a existência de uma determinação anterior à própria articulação, como se os oprimidos guiassem sempre em direção ao progresso. Podemos questionar, desse modo, se a noção de tradução não estaria mais relacionada à noção de consciência do que à noção de identificação, portanto, a identidades coletivas politizadas. Cabe-nos considerar que Mayorga et al. (2008) trabalham com a noção de “conscientização política” na reflexão sobre as causas das desigualdades, ao mesmo tempo em que vinculam este caráter “crítico” a uma dimensão contra-hegemônica, caracterizada pela construção de novas formas de representação da realidade.

Gomes e Maheirie (2011), tendo por objeto a participação política, também apontam para a noção de antagonismo em conjunto com a noção de identidade coletiva, aproximando-se de um modelo de consciência política (sujeito racional). Apesar disso, os dois aspectos centrais enfatizados são a dimensão da afetividade e a noção de dialética.

A dimensão da afetividade é compreendida por Gomes & Maheirie (2011) a partir de Vygotsky, que a entende como central “na apropriação dos significados constituintes e constitutivos das/pelas experiências do sujeito” (p. 365); e a partir da noção de “conatus do ser humano, compreendido por Espinoza como uma força para existir e agir na vida” (p. 368). Noção espinoziana também utilizada no artigo de Barboza (2000), discutido na vertente sujeito ético-político.

Os processos de subjetivação-objetivação, considerados por Gomes e Maheirie (2011) como fundamentais à constituição da participação política, se apresentam a afetividade como “motor”, são entendidos a partir da noção de “síntese dialética” (Vygotsky). As autoras concebem a dialética a partir da crítica a uma perspectiva que a compreende como síntese acabada: “A concepção dialética utilizada neste artigo se caracteriza por ser aberta e inacabada, marcando a transformação, e não a resolução, das relações contraditórias, ou seja, trata-se de uma perspectiva que critica a dialética como síntese acabada” (p. 364, nota de rodapé). Para tanto, recorrem a Sartre, afirmando o movimento de constante devir, caracterizado pela desconstrução e criação de significados.

Apesar das autoras citarem a noção de antagonismo e afastarem-se da noção de dialética como “síntese acabada”, a compreensão do político em termos antagônicos não se coaduna com um movimento dialético e com uma “força” (“conatus do ser humano”) que mobiliza o sujeito. A proposta das autoras aproxima-se mais da concepção observada em Barboza (2000).

Adrião e Toneli (2008), ao discutirem o sujeito do feminismo e as políticas de identidade no movimento feminista, criticam conceber o sujeito feminista em termos estáveis ou permanentes ou “como instância última e detentora de ‘uma’ identidade” (p. 466) e compreendem o feminismo em torno da utopia de uma política democrática radical. Essa utopia é entendida como a construção de uma política agonística que propõe “transformar o antagonismo de identidades em um agonismo de diferenças. Ou seja, em um pluralismo agonístico, porque onde as identidades se multiplicam, as paixões se dividem (Mouffe, s.d.2, pp. 267, 269-270, 274)” (p. 473, nota de rodapé), evitando o surgimento do antagonismo dentro da própria comunidade política.

Cabe-nos ressaltar que, como afirma Mouffe (2009), a política agonística não significa pôr fim ao antagonismo, uma vez que reconhece este como inerradicável. O que Mouffe propõe, e que podemos observar na compreensão de Adrião e Toneli (2008), é que um bom funcionamento democrático depende de um conflito vibrante de posições políticas, sendo o “eles” concebido não como um inimigo a ser destruído, mas como um adversário. Isto é, que, apesar dos desacordos sobre o sentido e a implementação dos princípios democráticos de igualdade e liberdade, que não são passíveis de solução racional (são antagônicos), tanto o “eles” como o “nós” compartilhem esses princípios na luta política.

As autoras se defendem, a partir de Mouffe, essa concepção sobre a constituição do sujeito político e sobre a democracia, afirmam trabalhar “com as definições de poder e discurso a partir da leitura de Michel Foucault (1984, 1994, 1998), bem como de sua correspondência na obra de Judith Butler (1987, 1997,1998, 2003) e de Stuart Hall (1995, 2005)” (p. 473, nota de rodapé). É possível questionarmos esta articulação teórica devido a divergências em relação às noções de antagonismo em Mouffe e Laclau e às noções de poder e de discurso no pensamento de Foucault. Como vimos em Leite e Aragão (2010), na vertente analítica Sujeito ético-político, a compreensão da dinâmica política a partir do pensamento de Foucault traz implicações que impossibilitam a viabilidade do momento do antagonismo, o qual é fundamental à compreensão de Mouffe sobre sujeito político e sobre democracia. Quanto à noção de discurso, Laclau (2000/2003) critica a associação feita por Butler entre a noção de discurso em Foucault e a noção de discurso defendida por ele e por Mouffe, pois, segundo ele, trata-se de um erro, na medida em que a concepção de Foucault está fundamentada numa distinção rechaçada por eles: a distinção entre discursivo e não discursivo.

Quanto ao último artigo presente nesta vertente analítica, o artigo de Menezes e Castro (2006), as autoras abordam o debate sobre política e juventude. De acordo com as autoras, a multiplicidade de reivindicações em nome das diferenças no contemporâneo torna ainda mais problemático pensar as bases sobre os quais se fundam os laços da convivência. Segundo elas,

Ao pensarmos tais bases no âmbito de uma perspectiva identitária do sujeito, ou de um campo político fundamentado na superação das diferenças em prol de um consenso a ser atingido, ‘recalcamos’ o conflito e a contradição do cenário político, esperando, assim, que ele venha a ser superado. (p. 18)

Neste sentido, criticam a concepção de democracia na abordagem racionalista do liberalismo político, baseada no consenso, afastando-se do “mito da sociedade transparente que, através do diálogo racional, poderia chegar a definir procedimentos tidos como verdadeiros e universais para a gestão da vida em comum” (Menezes & Castro, 2006, p. 18).

Outro aspecto a ser ressaltado no artigo é que se, por um lado, as autoras recorrem a uma noção de amizade no entendimento de formas de sociabilidade entre jovens e como modo de articular igualdade e diferença no interior de uma proposta democrática, apresentando uma preocupação em relacionar ética e política; por outro lado, sustentam a impossibilidade de uma junção entre esses elementos ao defenderem a compreensão de Mouffe da natureza do político como antagônica. Nesta medida, a ampliação de direitos localiza-se não no campo da multiplicidade, mas no reconhecimento da divisão como uma dimensão ontológica da dinâmica política, entendendo que “Hostilidade e conflito são aspectos ontologicamente constitutivos das subjetividades (pois a afirmação de cada sujeito se faz à custa da determinação de uma alteridade) e inerentes às sociedades humanas” (p. 31, nota de rodapé). Assim, ressaltam uma concepção de amizade que recorda a noção de agonismo em Mouffe, isto é, um agonismo que não exclui o antagonismo, diferente do que vimos na vertente analítica Sujeito ético-político.

A proposta das autoras possibilita tanto a crítica à lógica racional e moral do liberalismo político, que concebe aqueles que se afastam do tipo de racionalidade desejada como sujeitos não-razoáveis; quanto a crítica à eticização da democracia que, na busca incessante pelo outro, crê na possibilidade de uma política não-excludente, acabando, como o liberalismo, por invisibilizar o momento do antagonismo.

5 Considerações finais

A análise da produção em psicologia social sobre ações coletivas e do comportamento político permitiu-nos observar modos distintos de compreender a constituição dos sujeitos políticos e a construção da democracia.

Cabe-nos ressaltar nos artigos, por um lado, a busca pelos autores em construir análises sobre ações coletivas e sobre comportamento político a partir de uma concepção psicopolítica, buscando-se afastar de perspectivas individualistas e a-históricas que marcaram a produção da psicologia social antes da emergência de sua crise nos anos 1970/1980. Por outro lado, a presença de um reducionismo econômico, a ênfase na noção de sujeito racional ou a proposta de uma junção entre ética e política, como discutimos, acarreta na invisibilidade do momento do antagonismo, o que resulta em implicações para os outros dois momentos também definidores do político e, consequentemente, para a compreensão de aspectos importantes ao nosso contexto histórico: a pluralidade de sujeitos políticos e a disputa por direitos democráticos.

A radicalidade da contingencia, aspecto fundamental para compreendermos a relação entre indivíduo e sociedade sem cairmos em determinações últimas e, assim, numa compreensão dicotômica entre indivíduo e sociedade, fica limitada diante do determinismo econômico na compreensão da sociedade e também diante dos pressupostos da racionalidade e intencionalidade dos sujeitos.

Estes mesmos aspectos limitam o momento da articulação, na medida em que no primeiro caso, as demandas democráticas podem acabar sendo concebidas em torno da dicotomia entre luta principal e lutas secundárias; e no segundo caso, estas demandas podem ser reduzidas a sua dimensão particular, circunscrevendo a luta política à gestão da positividade social. No caso da vertente analítica Sujeito ético-politico, pudemos observar a utopia de uma oposição completa ao instituído, seja em termos da construção de um campo da multiplicidade seja em termos de uma totalidade homogênea.

Ao tratarmos da vertente analítica Antagonismo, pudemos observar proximidades em alguns artigos com as vertentes Sujeito racional e Sujeito ético-político, ainda que utilizassem o conceito de antagonismo a partir da concepção do político em Laclau e em Mouffe. Concebemos que estas articulações teóricas podem ser decorrentes de três hipóteses.

Uma primeira hipótese é que, ainda que se identifiquem com algumas teorias, os autores buscam recursos em outras teorias, mesmo que não compartilhem de um mesmo princípio epistemológico e ontológico, a fim de encontrar conceitos úteis para a análise do fenômeno abordado. Outra hipótese é que, mais do que rupturas paradigmáticas, observa-se na psicologia social continuidades e descontinuidades na produção do conhecimento. Neste sentido, poderíamos entender a presença de conceitos como consciência e identidade juntamente com a noção de antagonismo. Uma terceira hipótese, que está relacionada a esta segunda, é que, na crítica a perspectivas individualistas e, ao mesmo tempo, a análises macroestruturais das relações sociais, mantém-se na psicologia social um modelo analítico que, com diferentes matizes, fundamenta-se no conceito de consciência.

Sendo objetivo deste artigo contribuir com o campo da psicologia social crítica brasileira, além das considerações realizadas sobre cada vertente analítica abordada, propomos que a concepção do político apresentada pela teoria democrática radical e plural é relevante para a construção de análises psicopolíticas sobre ações coletivas e comportamento político na psicologia social crítica. Ressaltamos, neste sentido, o resgate da tradição marxista, que orientou muitas das produções da psicologia social crítica no Brasil na emergência da crise da psicologia social (e que ainda é importante arcabouço teórico neste campo), no interior de uma postura não essencialista. Outros teóricos no Brasil têm realizado a crítica à utilização do marxismo na psicologia social brasileira, apresentando como saídas, por exemplo, perspectivas orientadas para a noção de sujeito racional (Camino, 1996) ou para a noção de sujeito ético-político (Aguiar & Rocha, 2007; Rocha & Pinheiro, 2011).

Por meio da teoria democrática radical e plural enfatizamos o resgate da tradição marxista a partir da radicalidade da contingência, propiciada pelo imaginário democrático moderno, e da inerradicabilidade do antagonismo como condições fundamentas para a concepção dos sujeitos políticos e da democracia no contexto histórico presente. Ressaltamos a importância de compreendermos a luta democrática como uma luta hegemônica em um terreno político não essencialista a partir desses dois aspectos, pois, deste modo, evidenciamos a necessidade da articulação entre demandas democráticas de diferentes sujeitos políticos na construção de uma política democrática radical e plural, e nos afastamos tanto da redução do campo do político à gestão da positividade social, quanto de concepções de transformação social pautadas em determinismos, a priori, do sujeito e da sociedade.

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